TL 05: “EU QUERO TER UM MILHÃO DE AMIGOS": OS FORTES LAÇOS FRACOS DAS AMIZADES VIRTUAIS

Autores/as

  • Teresa Amorim

Resumen

TL 05: “EU QUERO TER UM MILHÃO DE AMIGOS": OS FORTES LAÇOS FRACOS DAS AMIZADES VIRTUAIS Teresa Waismarck Amorim RESUMO Partindo de uma reflexão acerca das relações virtuais, o presente tema tem como proposta problematizar a questão das amizades virtuais a partir do atravessamento dos dispositivos tecnológicos contemporâneos. Nossa tarefa é identificar o modo peculiar como as pessoas configuram suas relações de amizade on line através de um dispositivo tecnológico específico, a rede social do Facebook. Nossa proposta é apresentar um pequeno recorte da dissertação de mestrado desenvolvida pela autora sobre as novas redes de amizades virtuais a partir de algumas controvérsias sobre o que seria amizade e qual modalidade de amizade que essa rede produz na contemporaneidade. Palavras-chave: redes sociais on-line, relações interpessoais, amizades virtuais PROPOSTA Partindo da evidência das inovações tecnológicas ocorridas nas últimas décadas, o presente estudo teve como objetivo desenvolver uma pesquisa exploratória sobre amizades virtuais, questionando essas relações a partir das redes sociotécnicas. Foi feita uma breve genealogia da amizade, buscando apreender a dimensão filosófica da amizade e suas diversas concepções em diferentes momentos da história, a fim de problematizar a naturalidade com que definimos hoje as “amizades virtuais”. Buscou-se ainda evidenciar as diversas traduções e controvérsias presentes nessa rede na tentativa de investigar os sentidos dados ao conceito de amigo. As reflexões acerca das repercussões dessas redes de amizades virtuais são encontradas em Alex Primo (2009), que apresenta em seu blog “Dossiê Alex Primo” algumas considerações a esse respeito: “Eu quero ter um milhão de amigos”. Quando Roberto Carlos entoava esses versos jamais imaginaria que esse seria um objetivo de muitos interagentes das futuras redes sociais online. Mas cabe perguntar: o que é um amigo, o que é a amizade? A pergunta pode parecer óbvia, mas não encontra consenso na história da filosofia e da sociologia. Na verdade, o entendimento do que é um amigo varia muito de época para época. (PRIMO, 2009, s.p.) O recorte foi feito através do dispositivo tecnológico Facebook, uma das maiores redes de relacionamento social da Internet na atualidade. Foi realizada uma cartografia das relações de amizade na tentativa de compreender os novos vínculos na vida cotidiana. Nossa tarefa foi identificar o modo peculiar como as pessoas configuram suas relações de amizade virtuais. Este estudo surgiu a partir da minha experiência profissional como psicoterapeuta. Iniciei profissionalmente em um período em que as tecnologias do mundo virtual ainda não haviam invadido o ambiente doméstico. Desde então, tenho acompanhado as inovações tecnológicas, gerando alterações nas perspectivas humanas em suas formas de relacionamento social. No decorrer das duas últimas décadas, os clientes em terapia apresentam o desenvolvimento de vários tipos de relações afetivas através da Internet. Tornou-se possível encontrar amigos, fazer novas amizades, buscar parceiros virtuais assim como também é possível monitorar as pessoas. O espaço e tempo nas relações foram afetados e alterados com a nova realidade tecnológica, expandindo os limites e fronteiras humanas e, desse modo, transformando as relações sociais. Atualmente é possível observar um crescimento significativo dessas relações em redes sociais e suas implicações no dia-a-dia de nossos clientes. Parte desse entendimento é apontada por Lemos e Lévy (2010) quando afirmam que: [...] indivíduos constroem redes de contato, de amigos e de relações, participam de clubes, instauram grupos de trabalho, trocam mensagens, compartilham suas paixões, tagarelam, negociam coletivamente suas reputações, gerenciam conhecimento, realizam encontros amorosos ou profissionais. [...] As redes sociais on-line tornam-se cada vez mais “tácteis”, no sentido em que é doravante possível sentir continuamente o pulso de um conjunto de relações. (LEMOS & LÉVY,p.11-12) Segundo Castells (2009), as transformações ocorridas nas últimas décadas carregam também um sistema de tecnologia que mudou as interações sociais. Não é difícil admitir que “a virtualização atinge mesmo as modalidades do estar junto, a constituição do ‘nós’ ” (LÉVY, 2007, p.11). E Lemos e Lévy (2010) destacam que: “O desenvolvimento de comunidades e redes sociais on-line é provavelmente um dos maiores acontecimentos dos últimos anos, sendo uma nova maneira de ‘fazer sociedade’” (p.101). Nossa pesquisa tem, portanto, como desafio problematizar a produção dos relacionamentos (interações) no cenário virtual de nossa sociedade contemporânea, descrevendo o aglomerado de humanos e não humanos envolvidos na rede. Para dar conta desta pesquisa, a autora realizou uma pequena cartografia das relações de amizade do ponto de vista da Teoria Ator-Rede (TAR), proposta por Bruno Latour , buscando rastrear os discursos e as práticas a fim de compreender como se configuram as chamadas amizades virtuais. Do ponto de vista da TAR, precisamos “seguir os próprios atores” (LATOUR, 2008b) registrando seus movimentos de associações entre os elementos heterogêneos. A concepção de Latour funda-se na argumentação de que: “A natureza e a sociedade não são dois pólos distintos, mas antes uma mesma produção de sociedades-naturezas, de coletivos” (LATOUR, 2008a, p.137-138). Para compor nossa investigação a respeito da dinâmica das amizades virtuais através do dispositivo Facebook, buscou-se identificar as narrativas dos vários atores, e seus movimentos que confluem para a construção das amizades on line. Nossa proposta é apresentar uma pequena cartografia das novas redes de amizades virtuais a partir de algumas controvérsias apresentadas sobre o que seria amizade para aqueles que se apropriam deste dispositivo e qual modalidade de amizade essa rede produz. A presente investigação adquire relevância na medida em que pretende analisar as amizades virtuais articuladas a uma rede sociotécnica. Ao investigar o fenômeno das amizades articuladas a esses dispositivos tecnológicos, dentro do referencial da TAR, queremos chamar a atenção para a importância dos atores “não-humanos” na configuração da vida social. Em nossa trajetória pretendemos contribuir para problematizar a naturalidade com que definimos hoje as “amizades virtuais” nas redes sociais. Esperamos que esse olhar genealógico possibilite-nos apreender como a “amizade” já foi concebida de formas diversas, permitindo compreender sua configuração na atualidade fora de um registro necessariamente “negativo”. A pesquisa em questão pretende levantar algumas questões que podem enriquecer a discussão e compreensão do conceito de “amigo”. Nesta exploração, queremos, então, discutir o conceito de “amizade” e dar ênfase a alguns pensadores que analisaram a questão dos laços de “amizade”, permitindo-nos levantar algumas questões para a nossa pesquisa. Explorando os diálogos de Lísis em Platão, foi possível examinar os impulsos e sentimentos que motivam o homem na procura do “amigo”, como algo inerente aos humanos, e caracterizada pela reciprocidade, semelhanças e dessemelhanças. Na maioria dos textos de Aristóteles encontramos a maior parte das considerações fundamentais para o entendimento de nossa investigação sobre o conceito de “amigo”, dentre elas podemos destacar sua declaração de que a natureza humana é destinada a viver-com-os-outros. Com base nessa suposição, a ação humana deseja e busca a companhia dos “amigos”, levando-os a compartilhar. Além disso, Aristóteles aborda a distinção das três dimensões do que poderíamos entender por “amizades”, sejam elas baseadas na virtude, no agradável e no interesse. Ao apresentar uma ampla reflexão sobre a natureza da “amizade”, o filósofo examina também à distância, o convívio, assim como o número de “amigos” que deveríamos possuir. Acreditamos que parte dessa discussão será posteriormente recuperada para a análise de nossa investigação. As argumentações de Epicuro recuperam as idéias de Aristóteles sobre a felicidade na aquisição de “amigos”, pois apesar de utilitária, a “amizade” é um bem para a felicidade. Parte das considerações de Cícero fundamenta-se na importância de examinar a “amizade” como um fato natural, onde a força da “amizade” é gerada pela virtude, na verdade e no amor (BALDINI, 2000). Já nos discursos de Sêneca podemos encontrar a “amizade” vinculada ao ato de compartilhar, afirmando que a felicidade estaria associada ao viver para o outro, e se distanciando do interesse pessoal. O tema da “amizade”, vista pelos filósofos escolhidos para a pesquisa desperta nosso interesse na medida em que diz respeito aos novos vínculos virtuais vividos em nossa experiência cotidiana. Assim, algumas discussões filosóficas levaram-nos a uma reflexão sobre os valores e sentidos dados para a definição de “amigo”. Não tivemos aqui a pretensão de encerrar as formulações do conceito de “amizade” nessa breve genealogia, apenas traçar um panorama que possa contribuir para as diversas traduções do conceito de “amigo”, utilizadas no campo das “amizades” virtuais na contemporaneidade. Esperamos assim ampliar o caminho para as nossas discussões e compreensão desse novo fenômeno que faz parte do nosso coletivo assim como nossa prática clínica. Primo (2009), em seu blog, desenvolve a idéia da força dos laços fracos, ou seja, na medida em que permitir ter uma boa rede de laços fracos seria mais vantajoso, construindo assim um netwoking. O sociólogo Mark Granovetter (apud RECUERO, 2009, p. 62), em seus estudos, descobriu que os laços fracos seriam mais importantes para a manutenção das redes sociais. Nas palavras de Primo (2009): “a amizade passa a ser vista fundamentalmente de forma utilitária” (s/p.). Os resultados da pesquisa apontam para a constituição de uma nova modalidade de vínculo a partir desses novos dispositivos virtuais. Arriscaríamos afirmar que está sendo, sim, produzida uma nova modalidade de vínculo, constituída de forma radical por esses novos dispositivos virtuais. Não temos a pretensão de formular conclusões definitivas. Nossa intenção aqui foi buscar pistas, acompanhar, rastrear e buscar descrever a dinâmica esse peculiar modo de existência que certamente vem alterando nossas vidas. Até que ponto as novas tecnologias favorecem a extrapolação das noções de espaço físico e social no que diz respeito às relações humanas? Como ressalta Recuero (2009) o que mais atrai os sujeitos para a comunidade do Facebook, é a possibilidade de compartilhar informações e sentimentos íntimos em suas interações. Nessa perspectiva, a temática das amizades on line tornam um elemento essencial para os nossos estudos na prática da abordagem gestáltica, além de fomentar o desenvolvimento de novas formas de laços sociais. A pesquisa nos possibilitou o acesso a diversas traduções sobre o tema das amizades virtuais. A sensação de pertencimento, acolhimento são alguns dos traços deixados nessa pesquisa. Apesar da impossibilidade de rastrear todos os deslocamentos dessa rede, acreditamos que o desdobramento desse estudo permita produzir um novo sentido ao mundo comum das amizades virtuais traduzida por tantas vozes. Como gestalt-terapeutas precisamos, refletir sobre a riqueza dos diferentes tipos de vínculos que estão presentes na vida de nosso cliente. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ARISTÓTELES, Ética A Nicômaco. Pensadores, São Paulo, N. Cultural, 1987. CASTELLS, M.; A sociedade em rede. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2009. CÍCERO, M. Da Amizade. São Paulo: Martins Fontes. 2001. LATOUR, B. Ciência em Ação. 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Publicado

2014-09-18