MR 2: PSICOSSOMÁTICA NA GESTALT-TERAPIA E NA MEDICINA CHINESA

Autores/as

  • Sandro Quintana Golçalves

Resumen

MR 2: PSICOSSOMÁTICA NA GESTALT-TERAPIA E NA MEDICINA CHINESA Sandro Quintana Gonçalves RESUMO Este trabalho visa descrever as várias visões da relação corpo/mente, principalmente na gestalt-terapia e na medicina tradicional chinesa visando propor uma correlação entre estes saberes de uma forma que eles podem contribuir para uma melhor atuação psicoterapêutica. Palavras-chave: psicossomática, medicina tradicional chinesa, gestalt-terapia PROPOSTA No pensamento ocidental, Freud foi um dos pioneiros no estudo do que chamamos hoje como psicossomática, a relação da mente e do corpo. Ele demonstrou a capacidade de problemas mentais causarem sintomas físicos, como no caso das histéricas por ele estudadas. Sua linha de raciocínio preconizava uma relação unilateral, indo da mente para o corpo. Nesse caso, a mente teria uma espécie de soberania sobre o corpo, aonde problemas psicológicos causariam sintomas físicos. Entretanto, descartava a possibilidade de uma interação na direção contrária, onde problemas fisiológicos pudessem causar alterações psíquicas de algum tipo. A psiquiatria organicista também teve sua própria forma de psicossomática ao longo dos anos. Apesar de não nomeá-la desta forma, eles defendiam as relações corpo-mente em seus estudos, mas eram tão unilaterais quanto os estudos psicanalíticos, apenas tomando a direção inversa, salientando as influências do corpo sobre a mente. Primeiramente com a teoria dos “humores”, e mais recentemente focando nas influências bioquímicas dos hormônios e neurotransmissores na formação de alterações psicopatológicas tais como comportamentos compulsivos e depressivos, por exemplo. Em ambos os casos acima descritos, fortaleceu-se a separação entre corpo e mente como sistemas distintos que de alguma forma se relacionam. O primeiro autor, no ocidente, a propor uma quebra nesse muro teórico, foi Wilhelm Reich, ao afirmar “A dor no peito não é causada pela angústia. A dor no peito é a própria angústia.”, ele defendia não uma relação entre corpo e mente, mas uma integração corpomente. Esta proposta, talvez por seu pioneirismo, não conseguiu livrar-se totalmente da visão dicotômica, ora oscilando na importância da mente (principalmente do inconsciente em contrapartida ao consciente, o que é outra dicotomia), ora do corpo (como couraças). A gestalt-terapia propõe uma superação dessas dicotomias, ao compreender o ser humano como um organismo integrado que se manisfesta no campo em uma constante interação. Eliminando, assim, as divisões entre instâncias tais como “corpo” e “mente”, assim como “mundo interior” e “mundo exterior.” A obra inaugural da gestalt-terapia inclusive dedica um capítulo inteiro para superar tais ideias dicotômicas e propor este conceito unitário. Dentro deste contexto, “descrevemos um evento psicossomático como aquele em que as alterações físicas flagrantes são mais marcantes do que as que ocorrem num nível mental ou emocional” (Perls, 1981), ou seja, onde as manifestações da instância conhecida como “corpo” assumem o papel de figura, enquanto a “mente” torna-se fundo, e através da integração destas polaridades o organismo pode alcançar a satisfação de suas necessidades. Por outro lado, no pensamento oriental, a ideia de uma cisão entre corpo e mente ou homem e mundo nunca se formaram, e a maioria de suas correntes filosóficas descrevem uma interrelação constante, particularmente o taoísmo, corrente filosófica que originou o que chamamos hoje de medicina tradicional chinesa. Não precisando lidar com tais entraves conceituais encontrados pela gestalt-terapia em seus sessenta anos de existência, a medicina tradicional chinesa desenvolveu um complexo sistema de constructos teóricos e técnicas de atuação, dentre estas a acupuntura, reconhecida como técnica utilizável pelo psicólogo desde 2005. Um dos conceitos mais básicos da medicina tradicional chinesa, é das polaridades yin e yang. A primeira vista, este conceito parece apontar novamente para uma dicotomia, mas estes opostos não são isolados um do outro, pelo contrário, estão em constante interação e movimento, representando os movimento cíclicos, de expansão e retração, por exemplo, encontrados na natureza. O adoecimento ocorre exatamente quando a fluidez desta interação se encontra desequilibrada, manifestando-se no ser como um todo, apenas tornando-se mais visível em uma parte que se destaca do todo. Assim, quando um acupunturista estimula uma determinada combinação de pontos de através de suas agulhas, ele não está fazendo um embotamento de sintomas, como no caso de um analgésico para dor de cabeça, mas permitindo que o organismo encontre novos caminhos para lidar com os desequilíbrios apresentados pelo paciente. Permitindo que uma raiva que foi interrompida pelo paciente se manifeste, ao invés de criar a dor de cabeça retrofletida, por exemplo. Ou seja, a acupuntura pode ser utilizada pelo gestalt-terapeuta como mais um recurso de experimentação, atuando diretamente no corpo, permitindo que situações inacabadas possam se manisfestar de forma espontânea conforme desbloqueia o fluxo desequilibrado. Longe de tentar construir uma pedra de roseta que estabeleça uma tradução direta entre estes dois paradigmas, a proposta é que a partir de uma maior compreensão de alguns destes constructos e técnicas, o gestalt-terapeuta acupunturista possa aprimorar sua atuação como psicoterapeuta, integrando este conhecimento milenar ao seu arsenal de trabalho. Mas para isso, faz-se necessário observar as similaridades entre estas formas de olhar o ser humano buscando uma prática integrada, de outra forma o profissional tonar-se-á apenas um aplicador de agulhas. Por exemplo, ao compararmos os conceitos do ciclo do contato e do yin e yang, podemos ver uma correlação entre estes, aonde o pré-contato apresenta um momento do máximo yin, com o organismo em um estado de imobilidade ou repouso, mas já com a semente do yang, do movimento, proveniente de uma necessidade do organismo ou de uma exigência do ambiente, ao longo do contato, vemos um crescimento do yang através da deliberação e mobilização até alcançar o máximo do yang com o contato final, quando a espontaneidade é experimentada plenamente mas a semente do yin já se encontra presente em um início de relaxamento agora que as necessidades foram satisfeitas, por fim, o pós-contato traz um yin crescente em direção ao retorno da homeostase. Este tipo de cruzamento de saberes permite ao gestalt-terapeuta acupunturista elaborar um tratamento mais completo associando-se o método fenomenológico, a experimentação gestáltica e a acupuntura. BIBLIOGRAFIA MACIOCIA, G. Os fundamentos da medicina chinesa: um texto abrangente para acupunturistas e fitoterapeutas. São Paulo: Roca, 1996. PERLS, F. A Abordagem gestaltica e testemunha ocular da terapia. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1981 PERLS, F.; HEFFERLINE, R.; GOODMAN, P. Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 1997. CÂMARA, MARCUS VINICIUS DE ARAÚJO. Reich - o descaminho necessário: introdução à clínica e à política reichianas. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998. FREUD, SIGMUND. Cinco Lições de Psicanálise : Leonardo da Vinci e outros trabalhos. 2.ed. Rio de Janeiro: Imago, 1987. v. (Obras psicologicas completas de Sigmund Freud; edicao standard).

Publicado

2014-07-29