PN 01: PSICOSE COMO AJUSTAMENTO CRIADOR: UMA LEITURA DA GESTALT-TERAPIA

Autores

  • RAISSA MARIA BITTENCOURT DE MORAIS

Resumo

PN 01: PSICOSE COMO AJUSTAMENTO CRIADOR: UMA LEITURA DA GESTALT-TERAPIA Raíssa Maria Bittencourt de Morais RESUMO O trabalho teve por objetivo compreender como a Gestalt-terapia define e trabalha psicoterapicamente com a psicose. Os objetivos específicos foram conhecer a evolução histórica desta patologia, para melhor visualizar as modificações decorrentes dos processos de humanização, principalmente dos hospitais psiquiátricos; compreender a visão de natureza humana, tomando como referência os conceitos e os constructos teóricos de autores da abordagem gestáltica, e por último foi abordada a possibilidade da psicose enquanto ajustamento criador e as possíveis intervenções clínicas nos pacientes diagnosticados psicóticos. Atualmente ainda faltam estudos nesse campo de atuação de alta complexidade, assim como apresenta uma demanda de cuidado maior a cada dia em função do abandono e da exclusão sofrida por pessoas psicóticas. Tratou-se de uma pesquisa bibliográfica, pautada na premissa de recolher dados que embasasse a visão da gestalt-terapia sobre ajustamento criativo nos processos psicóticos. Palavras – chave: Gestalt-terapia; psicose; cuidado PROPOSTA Psiquiatria e a Psicologia têm se preocupado em obter maiores explicações e estudos sobre a psicose, uma vez que ainda existem questões a serem respondidas a respeito do processo de adoecimento vivido por sujeitos acometidos por este transtorno. A psicose é compreendida como um grave transtorno mental que afeta não apenas o comportamento, bem como a afetividade, causa sérias alterações no pensamento e na vontade, conduzindo os sujeitos a um afastamento da realidade. Este distanciamento é uma das maiores causas de preconceito e exclusão social. Conhecer a história desta patologia é importante para o entendimento de como ela é vista atualmente. Na Antiguidade e na Idade Média todos os marginais – sujeitos que viviam à margem da sociedade: os leprosos, as prostitutas e os ladrões – eram tratados como loucos. Neste período existia uma forte associação entre a loucura e o mal, o demoníaco. Seus comportamentos bizarros eram associados à falta de contato com a realidade e, por conta disto, eram banidos do convívio social. Para que este afastamento fosse possível, no Renascimento, foram criados os primeiros hospitais exclusivos para loucos. Este momento histórico é marcado pelo surgimento das primeiras classificações de doenças mentais. Desta forma, “a loucura recebia o estatuto de doença sem uma localização orgânica de lesão. A doença estaria num desvio do ideal de sociabilidade, em falhas na vontade e desvio nos instintos.” (Sterian, 2005, p.39) De acordo com Nunes (2001) a primeira descrição encontrada sobre a esquizofrenia foi descrita por Benedict Morel (1809-1873) como démence precoce, pois, o mesmo associava a formas de demência que surgiam na adolescência que tinham como sintoma distúrbios no pensamento, afeto e manifestações delirantes. Autores como Hecker (1863) e Kahlbaum (1984) descreveram grupos de sintomas semelhantes, contudo, com novas designações. Sterian (2005) aponta que entre 1890 e 1907, E. Kraepelin, em seu Tratado das Doenças Mentais, juntou todos os casos relatados pelos autores citados sob o nome de Dementia precox. Eugen Bleuler (1911) introduziu o termo Esquizofrenia, que significa ‘mente fragmentada’, visto que considerava inadequada demência precoce porque considerava que os distúrbios eram de natureza divergente dos processos demenciais. O advento da Psicanálise proporcionou maiores compreensões sobre as doenças mentais, sobretudo, apresentou uma nova abordagem, um novo olhar. Freud foi um dos primeiros a dar voz aos excluídos; a dar ouvidos à fala de seus pacientes. Sterian (2005) acrescenta a importância da descoberta do inconsciente e das pulsões apresentados por Sigmund Freud, uma vez que, este foi um dos autores que possibilitou reincorporar a loucura à subjetividade humana. Dito isto sobre a evolução histórica da loucura à psicose, faz-se importante considerar os estudos de Fritz Perls a respeito do modo de ser psicótico, visto que a Gestalt-terapia formulada por ele observa esta patologia de forma diferenciada. Tal diferença consiste, a priori, na forma como a abordagem gestáltica vê o homem e o mundo que o circunda. Para a Gestalt-terapia a experiência humana ocorre na fronteira de contato, toda interação humana acontece neste campo organismo/meio, por meio compreendendo-se o social. Desta forma, de acordo com Perls, Hefferline e Goodman (1997, p.43) em “[...] qualquer estudo de ciências do homem, tais como fisiologia humana, psicologia e psicoterapia, temos que falar de um campo no qual interagem pelo menos fatores socioculturais, animais e físicos”. Assim, compreendendo o homem em seu aspecto bio-psicossocial se entende que ele pertence a um meio de relações humanas, onde seu modo de viver e ser está relacionado aos seus laços e vínculos a outros seres. O ser humano é, então, sujeito de relação, de contato; um sujeito em constante transformação e construção. Perls, Hefferline e Goodman (1997, p.45) falam que “todo contato é ajustamento criativo do organismo e ambiente”. Sendo assim, todo individuo é sujeito de possibilidade, de criatividade. O individuo saudável possui uma abertura para a experiência, um contato ativo com a realidade. Na doença, ocorre um congelamento no processo de ser, um afastamento na responsabilidade de existir. Na psicose a experiência, as vivências e os contatos são afetados de tal modo que o sujeito não consegue se relacionar com o outro, seu ajustamento se torna fixado. Perde-se o sentido. No modo de ser psicótico o sujeito passa a viver de forma estereotipada, cristalizada; vivem-se experiências repetitivas cujo significado foi perdido. O problema do paciente não é que ele esteja fora da realidade, porque isso não sabemos. O que nós sabemos é que o psicótico perdeu a liberdade na relação com o resto da experiência dele. Ele está preso numa estereotipia (Pompéia, 2004, p.200). A perda do sentido, referido anteriormente, está atrelada ao crescimento humano. No momento em que o indivíduo não consegue mais ajustar-se de maneira satisfatória, criativa, para dar continuidade a seu ser; quando os contatos são insuficientes, pode-se dizer, o sujeito enlouquece. A importância deste trabalho se encontra na possibilidade de ampliar o entendimento da psicose através da abordagem gestáltica e de sua visão sobre o processo de adoecimento humano que leva os sujeitos a se ajustarem psicoticamente como uma forma de continuar a existir, assim como, diminuir os preconceitos e estigmas que circundam as pessoas que cristalizam e adoecem. REFERÊNCIAS NUNES, E. (s/d) Psiquiatria e saúde mental – conceitos clínicos e terapêuticos fundamentais. Rio de Janeiro. Atheneu. PERLS, F., HEFFERLINE, R., GOODMAN, P. (1997). Gestalt-terapia. (2a ed.). São Paulo: Summus. POMPEIA, J. A., SAPIENZA, B. T. (2004). Na presença do sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. São Paulo: Paulus Editora. STERIAN, A. (2001). Esquizofrenia. Coleção Clínica Psicanalítica. São Paulo: Casa do Psicólogo.

Publicado

2014-09-18