TL 24: REFLEXÕES GESTÁLTICAS ACERCA DA OBESIDADE INFANTIL

Autores

  • Rebeca Andrade de Paula Lemos

Resumo

TL 24: REFLEXÕES GESTÁLTICAS ACERCA DA OBESIDADE INFANTIL Rebeca Andrade de Paula Lemos RESUMO A obesidade vem apresentando um crescimento considerável no Brasil, com aumentos crescentes na infância. Por ser um problema que está afetando a sociedade, faz-se necessário que as ciências psicológicas estejam atuando e buscando estudar sobre os problemas que dela emergem. Para tanto foi realizado um estudo bibliográfico sobre epidemiologia da obesidade infantil, o processo de alimentação dentro da atual dinâmica da sociedade e com base no olhar da Gestalt-terapia, refletindo os possíveis recursos disponíveis nesta abordagem para atuar com crianças que estão obesas. Palavras- Chaves: Obesidade; Infância; Gestalt-Terapia Introdução A obesidade vem apresentando um crescimento considerável no Brasil, com aumentos crescentes na infância. Estima-se que 20% das crianças sejam obesas e que cerca de 30% da população adulta apresente algum grau de excesso de peso, sendo 25% dos quais casos mais graves. É um problema que está presente em todas as regiões do país, sendo considerada mais critica no Sul, segundo Recine & Radaeli (2011). Segundo Pellanda et al (2002), aproximadamente um terço dos adultos obesos, os são desde a infância, aumentando para até 75% quando a obesidade do adulto é do tipo grave. A obesidade apresenta como características o acúmulo excessivo de gordura corporal, podendo estar associado a diversas doenças e agravos à saúde como: doenças do coração, certo tipo de diabetes e câncer, dificuldades respiratórias, problemas dermatológicos e no aparelho locomotor (VELÁSQUEZ; MELÉNDEZ; PIMENTA; KAC, 2004). Desde 2009, o diagnóstico de obesidade em crianças é realizado com base em curvas desenvolvidas pela OMS (Organização Mundial de Saúde), nelas incluídas o Índice de Massa Corporal, considerando para sobrepeso e obesidade os percentis 85 e 97(MELO, 2011) A criança nasce e cresce dentro de um contexto e para entender o processo onde estrutura-se o hábito alimentar é preciso considerar os fatores que nele estão presentes que são de ordem biológica, psicológica, genético e sociocultural, que envolvem o prazer, entendido aqui como um fenômeno que “concerne ao processo de simbolização e de atribuição de significados às experiências vividas pelas pessoas” (Perez & Romano, 2004 apud OLIVEIRA et al, 2010, p.47). O prazer resultante da alimentação surge como um dos motores do funcionamento psíquico e do comportamento humano. A maior preocupação da psicologia frente a este tema, não deve ser com fato do individuo estar aparentemente em sobrepeso, mas no sofrimento que este estado possa estar trazendo para os seu organismo como um todo. Para tanto, faz-se necessário compreender a forma com que o sujeito chega ao estado de obesidade: se pelos tipos de produtos com os quais se alimenta, pela forma como ele usa a comida, ou ainda, pelo fato de estar sofrendo de um Transtorno da Alimentação, como por exemplo, a compulsão alimentar. A alimentação e seus significados O comer envolve outros aspectos que não somente a nutrição do corpo, associando-se ao estar junto, a uma troca e ao contato com o outro. O que se come também deve ser visto com base nas comidas da atualidade e, sobretudo, nos hábitos e costumes familiares que têm grande importância na manutenção dessa relação emocional com a comida, pois influenciam diretamente até mesmo no paladar e no gosto de cada sujeito (MATURANA, 2010). Considerando- se todo o contexto, podemos inferir ainda que a dinâmica das famílias na contemporaneidade, pode fazer com que a criança passe menos tempo com seus pais e, por conseguinte, o pouco tempo que tem para estarem juntos, não esteja sendo suficiente para suprir a qualidade de uma relação que a criança necessita. Tal situação pode levar a uma busca de satisfação substitutiva do afeto. Assim, esta dinâmica começa a moldar a relação afetiva da criança com o alimento. Segundo Maturana (2010), a relação inicial afetiva com o alimento, uma vez aprendida, será levada por toda a vida do sujeito. Entretanto, essa relação terá a possibilidade de ser, em todo o tempo, recriada de acordo com a pessoa e com o seu meio. Para esta demanda atual da sociedade, diante da epidemia de obesidade, acreditamos que a gestalt-terapia possa nos ajudar a refletir sobre esse afeto da relação com a comida, visto que Perls “ faz um paralelo entre o processo biológico da fome e da alimentação e os processo mentais, o que denomina metabolismo mental” (RANALDI apud D’ACRI; LIMA; ORGLER, 2007 , verbete AGRESSÃO, pág.19). A forma como nos alimentamos organísmicamente é também a forma com que metabolizamos mentalmente o que recebemos do mundo. De acordo com Perls (2002), o movimento mastigatório constitui uma relação saudável entre o indivíduo e a sua agressão, transformando o ato de mastigar em um mecanismo de elaboração interna, ainda que não seja de forma consciente. Essa capacidade de desestruturar alimentos é uma saída natural que tem como função o contato do emocional com o real, entre homem e mundo, sendo a oralidade fundamental para o desenvolvimento da personalidade. Quando essa atitude agressiva é positiva, a criança é direcionada a um crescimento criativo (PIMENTEL, 2005). A fome de alimento mental se comporta como a fome física, segundo Karen Horney (1969 apud Perls, 2002). Com base neste pensamento, podemos deduzir que uma criança ao utilizar um fantoche (sendo este um objeto material como a comida), ao mastigá-lo, expressa sua agressividade, ao mesmo tempo em que este lhe oferece acolhimento do alimento que lhe chega ao estomago. Podemos pensar que uma criança está obesa pelo fato de fazer uso da comida para atender uma necessidade que na verdade ela não identifica qual é. O desenvolvimento sadio e contínuo dos sentidos, do corpo, dos sentimentos e do intelecto da criança constitui sua base do senso de eu. A criança que está passando algum tipo de conflito possui alguma deficiência em suas funções de contato, que são: olhar, falar, tocar, escutar, mover-se, cheirar e sentir o gosto. Não conseguem fazer bom uso dessas funções ao se relacionarem com os adultos próximos e com seu ambiente (OAKLANDER, 1980). Conclusão Diante dos referenciais usados inferimos que a comida, na atualidade, vem sendo usada para ocupar uma ausência, como por exemplo, de um afeto, como forma de recompensa, refletindo a dinâmica de muitas famílias e da sociedade no momento atual. Por este motivo, o atendimento a criança não pode acontecer sem que haja uma compreensão do sistema ao qual ela pertence, elencados a seguir: “familiar, escolar e cultural” (PIMENTEL, 2005, p.52). A busca por um tratamento à obesidade na infância tem um caráter preventivo frente a outros problemas que a mesma pode vir a acarretar se não for tratada ainda no início. Entendemos que a criança tem a capacidade para assimilar o que se passa com ela, podendo se apropriar dos aspectos de sua existência e buscar formas de viver que lhe causem menos sofrimento e dor. A ampliação das funções de contato poderá permitir que a criança perceba sua necessidade e não mais busque a satisfação utilizando um “fantoche”, mas procure autorregular-se dentro de sua liberdade de escolhas e, mediante suas possibilidades. Infere-se que quando o sujeito se dá conta do processo e do próprio caminho percorrido para chegar ao estado de sobrepeso, tem-se a possibilidade de que, agora consciente, possa recriar novas relações com a alimentação que lhe tragam menos sofrimento e mais saúde. Outra questão é que o sobrepeso pode não está ligado a algum conflito da criança, e sim ao contexto onde ela vive. Portanto, é importante entender como a criança chega a este estado ainda na infância, e a partir desta premissa, direcionar o atendimento junto com os próprios recursos que a criança apresenta no aqui e agora. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS D’ACRI, Gladys; LIMA, Patrícia; ORGLER, Sheila. Dicionário de Gestal-terapia: “Gestaltês”. Summus. São Paulo: 2007, p.19 MATURANA, Vivilaine. Reflexões acerca da relação entre a alimentação e o homem. IGT na rede, Vol.7. N°12, p.177 a 219, 2010 MELO, Maria Edna de. Diagnóstico da Obesidade Infantil. Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica – ABESO, 2011. 266 OAKLANDER, Violet. Descobrindo crianças. São Paulo: Summus, 1980. OLIVEIRA, Valmir Aparecido; RIBAS, Camila Rezende Pimentel; SANTOS, Manoel Antônio dos; TEIXEIRA, Carla Regina de Souza; ZANETTI, Maria Lúcia. Obesidade e grupo: a contribuição de Merleau-Ponty. Vínculo vol.7 no.1. São Paulo: jun. 2010, p. 45 a 54. PELLANDA, Lucia Campos; ECHENIQUE, Laura; BARCELOS, Laura M.A.; MACCARI, Juçara; BORGES, Flávia K. ; ZEN, Bárbara L. Doença cardíaca isquêmica: a prevenção inicia durante a infância. 0021-7557/02/78-02/91, Jornal de Pediatria. Copyright © 2002 by Sociedade Brasileira de Pediatria. PERLS, Frederick S; Ego, Fome e Agressão- Uma revisão da teoria e do método de Freud. São Paulo: Summus, 2002 PIMENTEL, Adelma. Nutrição Psicologica - Desenvolvimento emocional infantil. São Paulo: Summus, 2005 RECINE, Elisabett; RADAELLI, Patrícia. Obesidade e Desnutrição. Ministério da Saúde, biblioteca virtual, 2011.

Publicado

2014-09-18