TL 18: CRIATIVIDADE E O EXPERIMENTO - O CRIAR ATIVO COMO POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO NA CLÍNICA INFANTIL

Autores

  • Pedro Garcia Faillace

Resumo

TL 18: CRIATIVIDADE E O EXPERIMENTO - O CRIAR ATIVO COMO POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO NA CLÍNICA INFANTIL Pedro Garcia Faillace RESUMO Este trabalho propõe a discussão da temática do brincar como modo de experimento na Gestalt-Terapia com crianças. Tendo em vista que a Gestalt-Terapia é uma abordagem de método fenomenológico, o psicoterapeuta desta abordagem fará uso de experimentos e não técnicas, ou seja, ele irá permanecer com a criança em seu processo, sem impor métodos ou truques, para que ela possa experimentar algo diferente no ambiente de segurança relativa que é o espaço terapêutico. Assim, sendo a capacidade de criar-se continuamente da melhor forma possível em sua existência o referencial de saúde para esta abordagem, o brincar pode se tornar um terreno fértil para experimentos que surgem de forma natural e orgânica. Palavras-chave: Criança, Experimento, Criatividade. PROPOSTA Para a Gestalt-terapia, a criança saudável é aquele capaz de se criar continuamente, da melhor maneira possível, na sua relação com o ambiente em que vive, assimilando o que for necessário para se desenvolver e rejeitando aquilo que lhe for nocivo. O comportamento problemático das crianças que chegam ao consultório pode ser entendido, então, como uma desarmonia relacional entre pessoa e ambiente, que formam uma unidade dialética e total (ANTONY e RIBEIRO, 2004). Ou seja, quando o seu potencial criativo é desconfirmado pelo ambiente, o indivíduo adoece e passa a se relacionar de forma insatisfatória. A criança em conflito desloca-se constantemente entre aquilo que acredita que deveria ou gostaria de ser e aquilo que é, nunca se identificando com nenhum dos dois (BEISSER in FAGAN & SHEPERD, 1980). A Gestalt-terapia irá entender, então, que o crescimento e a mudança encontram possibilidade de acontecimento na integração do que foi alienado, do que foi polarizado, corfimando e restaurando a crença da criança em seu próprio potencial criativo. Zinker (2007) define o experimento como a ferramenta básica para esta integração de polaridades. Sobre a experimentação, Polster e Polster dizem: O experimento em Gestalt-terapia é uma tentativa de agir contra o beco sem saída do falar sobre, ao trazer o sistema de ação do indivíduo para dentro do consultório. Por meio do experimento, o indivíduo é mobilizado para confrontar as emergências de sua vida operando seus sentimentos e ações abortados, numa situação de segurança relativa (2001, p. 238). Assim, a Gestalt-terapia abre espaço para a criatividade do indivíduo, para que possa encontrar novas formas de ser e transformar o seu suporte rígido e insatisfatório em uma nova capacidade de autorregulação mais flexível e sadia. Para Zinker (2007), os experimentos “podem começar como brincadeiras e desencadear profundas revelações cognitivas” (p. 30), e, ocorrendo de maneira satisfatória, pode ajudar a pessoa a caminhar rumo ao desenvolvimento e consolidar uma nova forma de ser. No mínimo, o experimento o levará até o seu limite conhecido, “até a fronteira onde seu crescimento precisa acontecer” (p. 144). Nem todas as crianças que chegam à psicoterapia são capazes de falar sobre si e as coisas que a incomodam com a desenvoltura de um adulto. Ela experiência muita coisa em sua vida que ainda não é capaz de expressar verbalmente, principalmente as crianças mais novas (OAKLANDER, 1980). A Gestalt-terapia, então, irá fazer uso do brincar, assim como de outros recursos lúdicos, como forma do experimento, onde estas crianças irão encontrar uma forma de expressão onde projetar todo seu material interno, suas fantasias, seus temores, suas frustrações, desejos e tudo aquilo mais que a faz ser única da maneira que ela é. Porém, ao lembrarmos que a Gestalt-terapia é uma psicoterapia de método fenomenológico, não existe interesse em fazer interpretações, buscando motivos que expliquem o porquê da criança agir de certa maneira. No trabalho fenomenológico com o brincar, esse material projetado é devolvido para a própria criança, para que ela tome consciência dele e possa elaborar de alguma maneira as coisas que sente. É possível dar inúmeros “palpites” interpretativos sobre o que acontece nas brincadeiras em uma sessão, mas o que realmente importa é que alguma coisa que aconteceu ajudou àquela criança a se desenvolver como indivíduo e isso basta (OAKLANDER, 1980). O experimento na Gestalt-terapia está à serviço da awareness e existem momentos certos e adequados para que seja proposto, dependendo de vários fatores, como o vínculo entre psicoterapeuta e cliente, assim como a disponibilidade do próprio cliente para tal experimento ou brincadeira. Esta deve sempre servir como criadora de sentido para o cliente e não como forma do psicoterapeuta confirmar as suas hipóteses ou satisfazer as suas curiosidades pessoais (ZINKER, 2007). Um experimento que ocorra fora de hora pode resultar em uma imposição à pessoa de “uma tarefa que resulta em um comportamento rígido e mecânico” (RIBEIRO, 1985, p. 109). Assim, é a criança quem irá escolher com o que quer brincar. Ainda que isto implique na repetição da mesma brincadeira inúmeras vezes, deve-se respeitar esta escolha (AGUIAR, 2005). A Gestalt-terapia não trabalha com a confrontação direta das resistências do cliente, portanto, por mais que o psicoterapeuta acredite que a experimentação em uma brincadeira diferente irá resultar em crescimento, é a criança quem decidirá o melhor momento para que possa experimentar o novo. Fica por conta da criatividade do psicoterapeuta a forma que irá trabalhar as questões de seu cliente a partir do que surge na brincadeira escolhida pela criança. Como diz Oaklander: [...] Não importa que técnica específica seja usada, o bom terapeuta permanece com o processo que evolui junto com a criança. O procedimento ou técnica é um mero catalisador. Já que depende da criança e da situação, cada sessão é sempre imprevisível. Uma idéia leva à outra, e novas técnicas para uma expressão criativa estão constantemente evoluindo: o processo criativo é um processo de final aberto (OAKLANDER, 1980, p. 219). Para ilustrar esta discussão será usado o caso de L., um menino de nove anos que chega à psicoterapia com questões relacionadas ao seu potencial criativo. Em um processo onde inicialmente a recusa por parte da criança a qualquer tentativa de orientação do psicoterapeuta era constante, o processo natural de brincar e uma postura dialógica acabam por possibilitar a criação de experimentos onde esta criança se torna consciente deste seu potencial criativo de forma participativa e começa a caminhar para uma possibilidade de alta terapêutica. BIBLIOGRAFIA AGUIAR, Luciana. Gestalt-terapia com crianças: teoria e prática. Campinas: Livro Pleno, 2005. ANTONY, Sheila e RIBEIRO, Jorge Ponciano. A Criança Hiperativa: Uma Visão da Abordagem Gestáltica. Brasília: Psicologia: Teoria e Pesquisa – Vol.20, Nº 2, pp.127-134 – 2004 BEISSER, A. A Teoria Paradoxal da Mudança. In: FAGAN, Joen e SHEPHERD, Irma Lee (orgs). Gestalt-Terapia: teoria, técnicas e aplicações. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980. OAKLANDER, Violet. Descobrindo crianças: a abordagem gestáltica com crianças e adolescentes. São Paulo: Summus, 1980. POLSTER, Irving & POLSTER, Miriam. Gestalt-terapia integrada. São Paulo: Summus, 2001. RIBEIRO, Jorge Ponciano. Gestalt-Terapia: refazendo um caminho. São Paulo: Summus, 1985. ZINKER, Stephen. Processo Criativo em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2007.

Publicado

2014-09-18