WR 10: CAMINHOS... SE NÃO TERAPÊUTICOS, AINDA GESTÁLTICOS

Autores

  • Luciana Loyola Madeira Soares
  • Claudia Baptista Távora

Resumo

WR 10: CAMINHOS... SE NÃO TERAPÊUTICOS, AINDA GESTÁLTICOS Luciana Loyola Madeira Soares Claudia Baptista Távora RESUMO Nosso propósito é dinamizar este workshop com questões que não se prendem à formulação de um corpo teórico e técnico para a conduta diária do gestalt-terapeuta. Temos a intenção de abrir um diálogo com os participantes buscando muito mais uma provocação quanto ao que fazemos e que não se encaixa em nada do que aprendemos como ‘tem que ser assim para ser Gestalt-terapia’. E, numa atividade num Congresso de Gestalt-terapia, quando saímos da f(ô)rma? A que forma chegamos? O que é ‘mais gestáltico’? E o que é ‘menos gestáltico’? A seguir, algumas das questões que permearão a proposta e que serviram de fio para tecermos o inusitado – tão inusitado quanto o que cotidianamente nos deparamos em nossa prática, que de previsível, literal e padronizada não tem quase nada. Palavras-chave: Gestalt-terapia, boa forma, intervenção clínica. PROPOSTA Escolhemos ser terapeutas. Somos tão frágeis e vulneráveis quanto fortes e resilientes. Lidamos todo o tempo com a condição multifacetada da existência humana. E é exatamente isso que nos liga e ‘des-liga’ uns dos outros em nossa transitória e marcante trajetória pelo planeta. Ao lançar-se à presunção de saber mais do outro do que ele próprio possa saber, o terapeuta evita correr o risco de não saber, experiência que mobiliza desconforto. Caminhamos por incertezas – esta é uma das poucas certezas que podemos ter - tanto quanto aquele que nos honra ao procurar-nos para compartilhar suas histórias inacabadas. O novo é o que emerge com a atualização da experiência sensível imediata > reconfigura passado, presente e perspectivas futuras. Ao adotarmos - ou sermos adotados - pela Gestalt-terapia vivenciamos a transformação como parte de nosso processo de formação, o que envolve a saída da f(ô)rma em que somos formatados desde o início de nossas existências. Em Soares (2009, p. 155) encontramos referência à importância da experiência compartilhada de formar-se e transformar-se como terapeuta: “Entendemos que essa é a expressão do que seja a formação do psicólogo enquanto um processo de transformação: tirá-lo da f(ô)rma que despotencializa e deixá-lo descobrir-se, revelar-se e potencializar-se ao partir em busca da melhor forma possível para si, criando-se e recriando-se a cada momento na experiência compartilhada de transformar-se.” Falcão e Costa (2011) também apontam a processualidade e o fazer compartilhado na formação do gestalt-terapeuta com valor artístico: “Assim constatamos o quanto nosso ofício tem de artístico; o quanto a formação do gestalt-terapeuta consiste um processo artístico impossível de ser visto com um desenho pronto. Não termina, é processual, é relacional, e depende das relações no grupo, das muitas mãos desenhando-se mutuamente.”. Mauro Amatuzzi (1989), baseando-se em Buber, afirma que a relação terapêutica não pode ser traduzida como diálogo pleno, pois há uma diferenciação de papéis que é essencial para a definição do contexto. Portanto, a desigualdade é incompatível com a mutualidade. No entanto, ele insiste que mesmo assim, em plena diferença, a mutualidade, a fecundidade do diálogo é o que deve ser buscado pelo terapeuta. A clínica psicoterapêutica está longe, ela própria, de ser uma forma fechada ou completa. Há temas e variações de linguagem e trajetória teórica dos psicoterapeutas que refletem naquilo que se denomina método. Na forma como a compreendemos a partir da orientação gestáltica, a intervenção clínica visa à criação contínua de significado e realidade. Nesse sentido sugere Távora (2009, p.46): “... pensar a teoria e experimentar o uso do conceito não como verdade, mas como ensaio, forma de abordar a realidade percebida por meio de imagens e construções conceituais.” Assim sendo é possível propor questões acerca da própria razão do psicoterapeuta, que pode ser chamada a se desracionalizar no sentido de abertura para a afetividade e para a dialogia. Isso nos leva também a considerar a questão dos valores explícitos e implícitos na prática psicoterapêutica. Recorremos a Quadros (2011, p.62), que nos indica a característica artesanal e relacional da formulação da intervenção em psicoterapia. Cada história é uma história não apenas por seu caráter subjetivo, mas principalmente pelas múltiplas relações que elas carregam. Portanto, teoria e prática precisam ser articuladas no intervir. Se realizamos uma mera transposição aplicada, perdemos a dimensão do fenômeno e corre-se o risco de imposições desastrosas. Se atuarmos na contraposição, também não conseguiremos sustentar a intervenção. Porém se pudermos construir uma intervenção que se articule sem invalidar nem o conceito nem a relação, é possível atuar de forma simétrica. Na abordagem gestáltica o perguntar nem sempre requer o responder, e mesmo assim, perguntar, perguntar-se é preciso; perguntar sozinho, perguntar com o outro, ouvir sua pergunta. Apresentamos algumas perguntas que servirão de dispositivo de interlocução com os participantes. Aqui também, não temos a pretensão de responder ou pedir respostas. Compartilharemos com os participantes perguntas que nos fazemos. O que é terapêutico na Gestalt-terapia? Terapêutico é acolher, ‘estar com’, cuidar, e... mais o que? Todos os caminhos que tomamos na lida diária de nossa prática têm objetivo terapêutico? Qual é o propósito de uma terapia? Terapia para que? Terapia para quem? Ser terapeuta é saber ou poder intervir? Então, ao fazer uma intervenção estamos sendo terapeutas? Toda intervenção é terapêutica? E quando não fazemos intervenção não estamos sendo terapeutas? Existe terapia sem intervenção? Existe intervenção sem terapia? O que estamos sendo quando somos terapeutas? O que estamos sendo quando não somos terapeutas? Como crer na potência criativa do encontro entre humanos? O que nos faz andar com fé? E, quando nos falta a crença nas possibilidades no Encontro? Como terapeutas, é plausível apostar no humano desconectado de sua própria condição humana, fragmentado, pretensamente autossuficiente, consumista, imediatista? É mais fácil deixar-se levar pelos deveriaismos? Legitimar o funcionamento por hábito em detrimento da autorregulação? E quando o cliente nos pede exatamente que o confirmemos na desesperança, na descrença? O que então nos dá suporte ético? E quando nos faltam recursos? Como consideramos a questão dos valores, ou da falta deles, na lida terapêutica? Como gestalt-terapeuta, como falar de ‘não terapia’? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMATUZZI, M. O resgate da fala autêntica. Campina: Papirus, 1989. FALCÃO, L. D. C. e COSTA, N. S. E. Escher – as mãos que se desenham. Trabalho apresentado no Congresso de Gestalt-terapia de 2011, São Pedro, SP. QUADROS, L. C. T. A prática clínica individual como desdobramento e reverberação do coletivo. Disponível em: IGT na Rede, vol.8, nº 14, 2011. SOARES, L. L. M. A Gestalt-terapia na universidade: da f(ô)rma à boa forma. Disponível em: Revista Estudos e Pesquisas em Psicologia da UERJ, ano 9, Dossiê Abordagem Gestáltica, 2009. TÁVORA, C. B. Três ensaios sobre o self: intencionalidade, crise e mudança. IN: Gestalt-terapia: Encontros. Instituto Gestalt de São Paulo, 2009.

Publicado

2014-07-29