Reflexões sobre o processo diagnóstico e a medicalização da infância

Autores

  • Rebeca Andrade de Paula Lemos

Palavras-chave:

diagnóstico e a medicalização

Resumo

O diagnóstico realizado no âmbito psicológico e infantil requer o olhar na criança e nos sistemas que fazem parte do seu campo, a saber, “familiar, escolar e cultural”(RIBEIRO, 2005, p. 52), por entender que os fenômenos psicológicos surgem das relações emocionais vividas na unidade criança-outromundo (ANTONY, 2009). A gestalt- terapia utiliza a teoria de campo como um ponto de vista ou método pelo qual é possível explicar e entender eventos, objetos, organismos ou sistemas e todas as forças presentes no momento em que ele ocorre. Estar com o cliente a partir do lugar onde ele se apresenta, sem buscar interpretar, como se houvesse um suposto saber de causa e efeito, coloca o profissional numa posição de proximidade e de aceitação empática, onde se entende que a suspensão do juízo aproxime o observador do fenômeno que se apresenta. Quando um sofrimento psíquico e emocional é diagnosticado por alguns profissionais de saúde, o uso de medicamentos tem sido, em muitos casos, a principal terapia prescrita. Segundo Bogochvol (2001, apud LEGNANI&ALMEIDA, 2004, p.116), “é parte do senso comum contemporâneo a idéia de que várias formas de sofrimento, de mal-estar, de distúrbios psíquicos são causadas, tratadas e curadas biologicamente” pp. 36- 7. Uma pesquisa realizada por psiquiatras e neurologistas da USP, UNICAMP, Instituto Glia de pesquisa em neurociência e do Albert Einstein College of Medicine (USA), utilizando uma amostra de, aproximadamente, seis mil crianças e adolescentes no Brasil, conclui que quase 75% das crianças e adolescentes que fazem uso de medicamento para déficit de atenção, foram diagnosticados erroneamente. O uso do medicamento, segundo Britto (2011), subiu 1500%, em 8 anos no país. Neste cenário atual, sugere-se que a medicalização pode estar servindo como um apelo, em que “a medicalização em larga escala das crianças nos tempos atuais pode ser lida também como apelo ao silêncio dos conflitos, negando-os como inerentes à subjetividade e ao encontro humano”p.160 (GUARIDO, 2007). Diagnósticos precoces realizados de diferentes lugares sejam na escola, em casa ou até mesmo por profissionais que atuam de forma classificatória, podem levar a alguns equívocos, tais como: um diagnóstico equivocado e, puramente, classificatório e um tratamento que não atende as reais necessidades da criança e que desconsidera todo o campo ao qual a criança pertence. A história da medicalização da infância é marcada pela maneira com que a infância foi sendo assimilada ao longo dos tempos. Bercherie ( apud GUARIDO, 2007, p.154) , subdividiu a história da psiquiatria infantil em 3 períodos: “1- a influência da pedagogia dos séculos XVIII e XIX; 2- os progressos da psicologia do desenvolvimento; e 3- as contribuições psicanalíticas nas definições da clínica psiquiátrica da criança”p.154. Ao falar destes 3 grandes períodos, Guarido (2007) destaca que o interesse dos médicos no inicio da psiquiatria infantil, era tratar desordens que impediam a criança de se tornar um adulto capaz de exercer plenamente suas funções intelectuais e morais. Hoje, temos pais e profissionais com a mesma preocupação, porém, apresentada com outra roupagem, em que, quando uma criança se desvia do que seria esperado dela, a preocupação com o futuro, de um vir-a-ser, se torna mais importante, em alguns casos, do que um sofrimento ou incomodo que ela esteja enfrentando no momento presente. Devido a este cenário e as informações coletadas, infere-se que haja muitos sintomas nos manuais que tornam comportamentos, situações cotidianas e sofrimentos pontuais em sintomas de transtornos mentais (GUARIDO,2007), e o número de diagnósticos equivocados podem estar surgindo dessa confusão de sintomas ou na busca de uma avaliação restrita e classificatória. Para a gestalt-terapia, todo sintoma é uma forma de autorregulação e não simplesmente uma inquietação ou falta de concentração, desassossego ou timidez, dentre outros. Por isso, classificar e medicar, desconsiderando este fator, pode levar a diagnósticos e formas de tratamento equivocados. Ao encontrar crianças que chegam com um diagnóstico prévio, seja do pediatra, psiquiatra, neurologista ou da escola, faz-se necessário um olhar delicado e diferenciado. Diante de tantos diagnósticos equivocados, entende-se que algumas patologias caíram no “senso comum” dos próprios profissionais de saúde e da educação e os diagnósticos acabam sendo realizados com sintomas isolados e sem um diagnóstico diferencial (PIMENTEL, 2005), sem um olhar diferencial frente ao conjunto de sinais e sintomas. Este estudo tem como objetivo refletir sobre o diagnóstico infantil que leva a indicação de medicamentos como a primeira e principal forma de tratamento, colocando a contribuição da gestalt-terapia e sua forma de olhar a criança e o sintoma frente a diagnósticos classificatórios. Para tanto, foi realizado um estudo bibliográfico, discorrendo sobre alguns conceitos da gestalt-terapia, a saber, teoria de campo e o sintoma como autorregulação na criança, frente ao cenário atual, onde se infere que a medicalização possa estar sendo utilizada de forma abusiva. Palavra 1: DIAGNÓSTICO Palavra 2: MEDICALIZAÇÃO Palavra 3: GESTALT-TERAPIA Modalidade de apresentação: Comunicação/ tema livre Área de concentração: Interdisciplinaridade e novas interfaces (com outras práticas)

Publicado

2015-12-01