A DIFÍCIL ARTE DO MUDAR: O trabalho terapêutico com o impasse

Autores

  • Luciene Mazzini Mazzini
  • Barbara Cabral Cabral

Palavras-chave:

DIFÍCIL ARTE DO MUDAR

Resumo

“Nós somos fóbicos, evitamos o sofrimento, especialmente o sofrimento de frustração. Somos mimados, e não queremos passar pelo inferno do sofrimento: conservamo-nos imaturos, continuamos a manipular o mundo, em vez de sofrer a dor do crescimento. [...] Nós preferimos sofrer com o constrangimento, com o ser olhado de cima para baixo, do que perceber nossa cegueira e recuperar nossa visão.” (PERLS, 1977, p. 84). Um dos momentos do processo terapêutico que podemos considerar mais crítico, é aquele em que há uma aparente estagnação. O que fazer quando o cliente não muda e apesar dos esforços do terapeuta, parece resistir as mudanças. Desse modo, o propósito deste estudo será apresentar possibilidades de trabalhos terapêuticos em momentos de impasse crítico. Para a Gestalt-Terapia o que impossibilita a tomada de decisões é o medo do desconhecido e o de perder algo. Segundo Zinker (2007, p. 34): “O cliente vive constantemente o dilema existencial de sentir-se dividido entre o doloroso conforto de sua integridade existente e a necessidade de mudar. Em geral, o processo criativo é prejudicado quando cliente e terapeuta inadvertidamente se identificam com partes isoladas da personalidade do cliente: o terapeuta anseia por mudanças e o cliente luta com unhas e dentes por sua ‘integridade’.” Para que a terapia aconteça da melhor forma, o psicólogo precisa respeitar o cliente e não apressa-lo a tomar atitudes, das quais o indivíduo desconheça. Deve possibilitar que ele experiencie um novo comportamento, e ao mesmo tempo, precisa ser respeitoso e compreensivo em relação a sua postura e limitações. Zinker (2007) explica que devemos receber a pessoa como ela é, compreendendo o que existe, pois a partir do processo de troca e exploração da vida do cliente que este começará a mudar. O terapeuta deve mobilizar a energia do cliente para um comportamento novo, mais adaptativo, sem "apressar o rio". (ZINKER, 2007, p. 49). Segundo EFA (2002, p. 106), a neurose é “processo de desvitalização e enfraquecimento das frustrações de grande parte da personalidade”, ou seja, a cristalização das estratégias do indivíduo, o que não deixa de ser uma tentativa de encontrar o equilíbrio. Porém a pessoa vai para a vida, usando sempre as mesmas estratégias para se sentir seguro, mesmo que o meio não exija isso. Ela se afasta da autenticidade, do que realmente é, a pessoa “quer viver para um conceito, para a realização desse conceito” (FAGAN, 1977, p. 36), é o que Perls denomina de representação de papeis. A partir do momento em que o sujeito reconhece a representação de papeis que esta vivendo, começará a sofrer, sentindo uma forte angustia. E essa pessoa viverá o impasse, entre o mudar ou continuar em uma vida de insatisfações. Perls (1997) explica a representação de papeis e o impasse, quando escreve sobre as Camadas da Neurose, onde estruturou-se a neurose em cinco camadas, que são: o clichê, a representação de papeis, o impasse, a implosão e a explosão. Perls in Stevens (1977, p. 46) afirma que “O impasse é o estar encalhado, paralisado, nem esteriorizando, nem não esteriorizando”. A pessoa que não opta pela mudança não consegue passar para a próxima camada da neurose, chamada implosiva ou morte e por isso fica presa no impasse, fica com uma "sensação de estar preso e perdido" (PERLS, 1997, p.84). Sendo assim, sua atitude mais comum é evitar o sofrimento, e principalmente a frustração. Por conseguinte, faz escolhas que já são conhecidas, mas que vão mantê-lo da mesma maneira. O que designa uma perda da função "ego" e da função "personalidade" do self, pois segundo Ginger "a escolha da atitude adequada passa a ser difícil ou desadaptada" (Ginger in D'Acri, Lima, Orgler, 2007, p.127), onde, por sua vez, não ocorre crescimento. Com essa forma de ser, não é possível que o indivíduo amadureça, assim como Perls (1997) afirmou que a pessoa é mimada e foge do sofrimento, por isso continua imaturo, ao invez de experimentar o crescimento. Nesse momento a pessoa faz contato com sua necessidade, sabe qual é o seu desejo, mas não quer se responsabilizar pelas consequências, caso sejam ruins. Mas para que o indivíduo se desenvolva, é preciso que ultrapasse a dor do impasse e chegue na camada que Perls chama de "implosiva" ou da "morte". Esse nome se dá devido a paralisia provocada pelas forças em oposição. Segundo Perls (1997, p.85) "É uma espécie de paralisia catatônica: nós nos agregamos, nos contraímos e comprimidos, nos implodimos." . Nesta camada, a sensação é de nada, de estar vazio, no entanto aberto a inúmeras possibilidades, sendo que ao se permitir sentir isso, o indivíduo vive um vazio fértil que é o potencial criativo do self. A implosão é transformada em explosão que se une à "personalidade autentica, ao verdadeiro self” (PERLS, 1997, p.85). O gestalt-terapeuta, com esse tipo de cliente, trabalhará com as introjeções do indivíduo, pois o introjetor acredita que se fizer o que o outro solicita passará a ser amado, sendo assim, a dificuldade em desfazer a introjeção está na quebra desse tabu. O indivíduo passa anos da sua vida absorvendo experiências sem questionar e dificilmente abandona esses comportamentos. Essas introjeções são barreiras entre o indivíduo e o mundo, e o trabalho do terapeuta será nessa quebra, permitindo que o indivíduo critique e seja capaz de expressar o que sente, desenvolvendo características como a independência e a responsabilidade. Proporcionará o aumento do seu senso de eu, ajudando-o a perceber que pode fazer novas escolhas, incentivando a prestar atenção no que acontece. O psicólogo também precisa ajudar esse indivíduo a integrar suas polaridades, pois como afirma Zinker (2007, p. 220) "a pessoa saudável é um circulo completo, que possui milhares de polaridades integradas e entrelaçadas, todas fundidas umas com as outras.". O trabalho terapêutico precisa buscar a ampliação da awareness, do autoconhecimento, sendo capaz de incluir polaridades egodistônicas (inaceitáveis ao self) e refinar as ego-sintônicas (aceitáveis a consciência do indivíduo), possibilitando reavaliações do já estabelecido, com a intenção de que ele encontre uma nova versão criativa de solução para que seja evitada a estagnação, a acomodação e dê possibilidade ao vir-a-ser. Outro objetivo do terapeuta, com esse tipo de cliente, é descobrir que fantasias o indivíduo cria a ponto de provocar o surgimento do medo e de expectativas catastróficas, impedindo a mudança. Nesse caso é necessário ajudar esse cliente a ampliar sua awareness, facilitando o contato com ele mesmo e com o ambiente, reduzindo sua fuga para a fantasia que antes era tido como único recurso. Sendo assim, as mudanças acontecem de forma aleatórias, já que o indivíduo não está acostumado a conhecer seus próprios desejos, e só sabe aquilo que não deseja e precisa mudar. Portanto, PHG (1997, p.254) acredita que se o indivíduo “não puder se auto-identificar e alienar o que não é ele em termos de suas próprias necessidades confortará um vazio. O ambiente social contem toda a realidade que existe, e ele se auto constitui identificando-se com padrões desse ambiente e alienando o que são potencialmente seus próprio padrões.” Palavra 1: impasse Palavra 2: mudança Palavra 3: medo Modalidade de apresentação: Comunicação/ tema livre Área de concentração: Contribuições teóricas

Publicado

2015-12-01